quinta-feira, março 22, 2007

Uma crônica anunciada

Beatriz Fagundes

Há menos de uma semana, a senhora governadora Yeda Crusius festejou um superávit nas contas públicas e, ontem, anunciou falta de verbas para pagar em dia parte dos funcionários.

O salário de quase 10% dos funcionários públicos estaduais vai atrasar. Sem ineditismo, trata-se de uma crônica anunciada. O interessante é que o corte vai atingir em cheio as categorias que votaram no projeto de Yeda Crusius e Paulo Afonso Feijó. Durante a campanha, parecia que conheciam tão bem os problemas do Estado que, ao assumirem, cobrariam as dívidas dos sonegadores, acabariam com as megaisenções fiscais, fortaleceriam os fiscais da Fazenda e administrariam o Estado com total apoio do funcionalismo. Mas, para quem não votou no projeto, e foram 46% dos eleitores gaúchos que votaram no projeto de Olívio Dutra e Jussara Cony, não causa qualquer surpresa a situação de hoje.

Existem modelos para o governo
Nos dias 7 e 8 de dezembro de 2006, foi realizado um seminário em Porto Alegre, organizado pelo PT, que teve como destaques as presenças do sociólogo paulista Ricardo Guterman e do advogado mineiro Carlos Morato. Durante dois dias, eles discorreram sobre o modo tucano de governar. Afinal, São Paulo está sob administração do PSDB desde o saudoso Mario Covas, e Minas Gerais passou antes por Aécio Neves, hoje no segundo mandato. O projeto é o mesmo para o Rio Grande, com pequenas diferenças, atendendo a singularidades regionais.

Em São Paulo o Estado diminuiu
No Estado de São Paulo, o dinheiro das privatizações levadas a cabo na década de 90 não amortizou a dívida pública, não promoveu o ajuste fiscal e sequer foi aplicado nas sempre carentes áreas sociais. Na teoria, a venda das estatais teria exatamente esse destino, qual seja, amortizar a dívida fundamentalmente, mas na prática a dívida pública triplicou. Os neoliberais paulistas, que servem de espelho para a atual administração estadual, superestimaram as receitas para apresentar superávit e promoveram congelamento salarial, aumento de taxas e passaram áreas essenciais dos serviços públicos para as chamadas OSCIPs (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público). Hoje, milhares de processos tramitam na Justiça, questionando o Estado e, na Assembléia, restam dezenas de pedidos jamais atendidos pela base parlamentar de CPIs. Qualquer semelhança não é mera coincidência.

Em Minas Gerais, o modelito ideal
Assim como em São Paulo, no território mineiro, o incensado Aécio Neves aplicou o tal “choque de gestão”, cujo eixo é o congelamento de salários e a redução do crescimento vegetativo da folha de pagamento. O modelo inclui avaliação do desempenho individual, carreiras, adicional de desempenho, prêmio de produtividade, perda de cargo público e instituição de emprego público, sendo que os novos empregados perderam, entre outras vantagens, o adicional por tempo de serviço. Além disso, instituíram o AVI (afastamento voluntário incentivado). Em Minas, foram criadas novas taxas, entre elas, a taxa para a segurança pública. Quem tem dinheiro e pode pagar conta com segurança, quem não tem... Além disso, majorou tarifas de energia elétrica, combustível e telefone, transferindo papéis fundamentais do Estado – saúde e educação – para a OSCIP, precarizando investimentos sociais e fortalecendo fundos de financiamento, enquanto fortalece a guerra fiscal. Qualquer semelhança passada, presente ou futura não é mera coincidência.

No que acreditar
Como diria aquele personagem do velho programa humorístico “Planeta dos Homens”, “não precisa explicar, eu só queria entender”. Ora, há menos de uma semana, a senhora governadora Yeda Crusius convocou uma coletiva para festejar que, nos dois primeiros meses do ano, houve um superávit nas contas públicas. E ontem, anunciou falta de verbas para pagar em dia parte dos funcionários. Como estamos entrando em fase de negociações salariais, e como se sabe que parcela considerável dos serviços públicos essenciais – é intenção do governo – devem ser entregues às tais OSCIPs, onde está a verdade? Teve superávit ou foi apenas um equívoco da superequipe de quatro pessoas que comanda o Rio Grande do Sul? Sim, pois os secretários de Estado fazem apenas figuração, ou não?

Notícias do Jornal O Sul do Dia 22/03/2007

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